Talvez o fato que me obrigou a
vir escrever não mereça uma crônica como quereria o mestre Sabino ao escrever
sua “Última crônica”, não a última derradeira, pois muitas crônicas sucederam
aquela singela comemoração de aniversário, no entanto a melhor. O acontecido
comigo é algo que não estamos acostumados a ver, foi excepcional, aconteceu por
acaso. Mas devido ao incomodo mental que estou sentindo pela pressão do texto
querendo sair e ganhar vida, não me contive; deixei os afazeres domésticos de
correções de trabalhos de alunos e vim para esse parto mental.
O caro leitor há de me
recriminar, com toda certeza, dizendo que estou exagerando, que no nosso país
algo desse tipo é tão irrisório que não há nenhum registro. Sei, sei, digo eu,
sei disso; mas vamos aos fatos. Sabe quando temos toda pressa do mundo em
resolver uma situação, e parece que as coisas andam ao contrário, como se fosse
uma conspiração universal contra a gente? Pois então. Precisava resolver uma
situação burocrática em uma agência bancária. Depois de muitas idas e vindas,
muitos documentos copiados, autenticados, protocolados, carimbados e
conferidos, o gerente me deu a certeza que em três dias me ligaria para
confirmar a operação. Como não recebi nenhuma ligação nesse período, uma semana
depois fui à agência. O gerente que me atendeu não estava, fui informado por um
gerente que fazia atendimento a uma senhora. Mas que eu aguardasse que seria
atendido por outro gerente. Depois de
meia hora me informei com um gerente que passava com uma papelada nas mãos.
Gentilmente ele pediu que sentasse à mesa, que a gerente que fazia atendimento
naquela mesa me atenderia em dez minutinhos. Não fosse o incômodo da cadeira,
eu teria dormido nos quase cinquenta minutos que se passaram.
Do interior da agência veio uma
gerente, se alesmou na cadeira a frente do computador, mexeu lentamente no
aparelho, estava reiniciando o sistema, disse-me ela. Depois se explicou
dizendo que a demora se deu pelo fato de que a gerente que ia me atender
precisara sair, no entanto ela iria resolver meu caso. Informei do que se
tratava, ela anotou números num papel, olhou no sistema, foi a um armário,
abriu várias gavetas e voltou. As poucas ações dela consumiam um tempo que
daria para o criador desmanchar tudo que fizera até agora e refazer caso
estivesse entediado com a plenitude celestial.
Novamente se alesmou na cadeira e
foi arrastando as palavras para fora de sua boca. Cada palavra parecia pesar
uma tonelada, era incrível o esforço que ela fazia para se comunicar. “Não
encontrei nada referente ao seu caso” – disse. Depois completou: - “o senhor
terá que vir na segunda-feira, quando o gerente que lhe atendeu vai estar aqui”.
Dito isso, tive a nítida impressão que ela cairia dormindo por sobre a mesa. Por
um momento vacilei se deveria socorrê-la. Foi quando ela abriu os olhos e vi
que, o que parecia para mim um profundo sono, era apenas uma piscadela de olho.
Protestei, é claro, falei da continuidade do serviço público, que independente
de quem seja o agente - no caso, o
gerente - o serviço teria que ser executado. “É que terei que procurar ...
depois faço isso com calma.” Foi o argumento dela em tom de protesto. Dessa vez
se deixou cair no encosto da cadeira. Ouvi um ranger de peças de ferro sendo
esmadas, parecia um pedido de socorro da cadeira. Disse a ela que não tinha
pressa, menti, que ela poderia procurar com calma.
Não tendo outra saída a não ser
trabalhar, afinal era para isso que estava ali, a gerente deu o alívio merecido
para a cadeira. Juro que não minto, mas ouvi um suspiro vindo do pobre objeto.
Arrastou-se para o interior da agência. Tivesse eu a mesma relação que tinha
Josué com o astro que governa o dia, teria pedido ao sol que parasse; pois via
meu tempo se exaurindo sem nada resolver.
Como diria minha vozinha se
estivesse viva ao meu lado, “deu tempo de cozinhar um galo”. A gerente voltou.
Alesmou-se novamente, para o desespero da cadeira que se tivesse consciência,
certamente teria pedido exoneração da função. Não tinha jeito, com a falta do
gerente, ela nada poderia fazer. Meus documentos não foram encontrados, nem
havia nenhum registro no sistema.
O falta de gerência! Foi só o que
pude dizer ao sair.
Nossa que pérola! Sinto tanta falta desta tua analise cada vez mais rara. Entendo que o tempo é escasso e isto torna cada postagem ainda mais preciosa. Muito obrigada por todo esse carinho que você tem ao nos informar.
ResponderExcluirObrigado, minha amiga, realmente estou com dificuldades devido meu tempo excessivo em sala de aula, outro fator porém tem contribuído, estou com problemas em meu pc, não consigo acessar a página do blogger para postagem. Estou esperando sair o pagamento para levar o computador na assistência.
ResponderExcluirCreio que isso daria um belo quadro surrealista nos moldes do Salvador Dali...
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