sábado, 2 de junho de 2012

SÁBADO - PRESERVATIVO NA COMIDA

Maria Parda - Personagem de O pranto de Maria Parda - obra de
Gil Vicente
O sábado é um daqueles dias, para os pobres mortais, meio útil meio feriado - como se houvesse dia inútil. Quem é servidor público tem o privilégio de curtir o sabadão em casa. Dencansar bastante. É claro, depois de dar uma geral na casa, limpar o quintal, colher o lixo, lavar o carro, fazer aquele serviço adiado da semana, ufa! não dá nem para preparar o almoço.
Num desses típicos dias de sábado, fui a um desses restaurantizinhos que vendem marmitex, comprei dois. O almoço estava garantido. Passei em uma mercearia para comprar aquele refrigerante. Almoço sem aquele refrigerante não é almoço.
No interior da mercearia, como virou moda na cidade, estavam alguns fregueses junto ao frizer consumindo aquela cerveja em lata. A cena me deu uma sede! Não sou de ferro!
_ Me dê aquele refrigerante de litro e maio e três latas daquela cerveja.
Enquanto o dono da mercearia pegava a minha encomenda, uma senhora já de idade se aproximou de mim. Estava cambaleando. Seu rosto negro chupado pelo tempo que formava uma moldura feia para seus olhos pequenos fez-me lembrar de imediato a Maria Parda, do Gil Vicente.
Desviei o meu olhar e passei a procurar nada nas prateleiras. Ela se aproximou. Olhei disfarçado e ela me encarou com um olhar miudo e um sorriso elástico, ia dizer-me alguma coisa. Percebendo eu o diálogo que ela queria iniciar comigo, pensei em pedir alguma coisa ao merceeiro (essa palavra existe?) só pra cortar a conversa, ou melhor, não iniciá-la, "meu deus, pedir o que". Ela ia abrindo o sorriso para falar e eu:
_ Preservativo! O senhor tem preservativo, não?
_ Sim. -disse o homem já com a minha encomenda embalada- quantos vai querer, amigo?
_ Ah, um pacote, por favor.
Não olhei para o lado. Paguei a conta e saí.
Cinquenta, sessenta anos, talvez, bêbada a essa hora em uma mercearia? Se fosse um homem, tudo bem, ninguém havia de estranhar, mas, "uma senhora!", pensava eu já no carro em voz alta, com meus preconceitos.
Mesmo depois da briga de minha mulher quando viu entre as compras do almoço um pacote de preservativos que não usamos mais, há mais de três anos, quando ela fez laqueadura, fez-me esquecer aquela cena.

4 comentários:

  1. KKKKKK, bem feito Aurismar, quem manda ser preconceituoso. quer dizer que se fosse um homem bebado era normal, mas a vovozinha não pode tomar uma antes do almoço pra abrir o apetite como vocês homens fazem?

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  2. Uma crônica ou um conto? De qualquer modo, a narrativa é muito boa... e ainda por cima, tua mulher lendo esse teu texto, pode até acreditar mesmo ser essa a explicação para o preservativo. Realmente, essa eu vou deixar anotado para quando chegar a minha vez de apresentar uma explicação dessas. rs,rs,rs...

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  3. Insensivel isso sim. Preconceituoso não. talvez ela quizesse pedir-lhe algo para saciar a fome,que bate no estômago vázio de quem bebeu algumas,talvez financiada por outro insensivel que ao invéz de comida deu-lhe a medida embriagues para que ela o parasse de pertubar.

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  4. Uma crônica, Moisés, mistura realidae e ficção.

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